"Acho que é claro que não há empreendedorismo suficiente no setor climático, em geral, mas também no Brasil. Existem empreendedores talentosos e existem desenvolvimentos interessantes, mas acho que todos nós podemos dizer que deveria haver dez vezes mais."

Entrevista foi feita em Novembro, 2023.
1. Qual é a sua formação e experiência em soluções baseadas na natureza (SBN)?
Hoje sou cofundador e CEO da Mombak. Estamos trabalhando para nos tornarmos a maior empresa de remoção de carbono do mundo, começando pelo reflorestamento da Amazônia. Antes disso, fui CEO da 99, o aplicativo de ridehailing no Brasil que foi adquirido pela Didi em 2018.
Depois do exit, tirei um ano sabático focando no meu crescimento pessoal. Uma das coisas que fiz durante esse período foi morar por vários meses em um mosteiro budista no Vietnã. Naquele momento, eu estava refletindo sobre o que queria fazer com a minha vida, buscando uma existência significativa e gratificante. Havia muita pressão para começar outra empresa - sem uma razão em concreto. Eu estava pensando no que estava funcionando na China, mas que ainda não havia sido feito no Brasil, mas isso estava me matando por dentro. Percebi que essa busca incessante só ia me deixar infeliz.
Em um determinado momento, pensei que não voltaria a trabalhar no modelo tradicional. Poderia dedicar meu tempo ao voluntariado e teria uma vida muito gratificante que não teria absolutamente nada a ver com a criação ou crescimento de empresas. Fui para a Tanzânia e trabalhei em uma organização sem fins lucrativos, ajudando a construir um sistema de saúde. Foi incrível, mas fiquei frustrado com a falta de capacidade de expansão. Então, acabei percebendo que, afinal, eu queria fazer alguma coisa. Aprendi muitas coisas nos capítulos anteriores no Google e na 99, parecia uma pena não usá-las de alguma forma.
O que mais me chamou a atenção foram as questões climáticas, e o motivo pelo qual eu queria trabalhar com isso foi o sofrimento humano. Acho que soa estranho quando as pessoas dizem que querem salvar o planeta, porque o planeta ainda estará aqui daqui a 200 milhões de anos. Houveram cinco extinções em massa até hoje, e estamos causando a sexta. O mundo vai ficar bem, a natureza vai ficar bem, o que não vai ficar bem são os seres humanos se tornarmos nossa sociedade insustentável.
A ficha caiu quando li o Project Drawdown, um excelente trabalho de análise científica publicado em 2018, que quantifica diferentes maneiras de reduzir ou remover o carbono da atmosfera. Filtrei a lista para a remoção de carbono especificamente porque entendi que não basta simplesmente emitir menos CO2, precisamos de fato retirar o CO2 da atmosfera. Paralelamente ao fato de saber que basicamente não há remoção de carbono acontecendo hoje, também entendi que o Brasil tem a maior oportunidade de remover carbono da atmosfera.
Não vou conseguir construir carros elétricos, fazer uma nova tecnologia de bateria ou fazer fusão no Brasil, mas posso escalar o reflorestamento? Talvez. Pensei que, se eu reflorestar, posso realmente fazer uma diferença significativa. Foi assim que acabei fazendo isso.
2. Como você descreveria a proposta de valor da sua organização para alguém novo no setor?
Estamos construindo os maiores projetos de remoção de carbono do mundo por meio do reflorestamento da Amazônia. Nosso cliente-alvo são grandes empresas que estão trabalhando para se tornarem neutras em carbono. Por que as empresas querem ser neutras em carbono?
O motivo subjacente mais importante é que houve uma mudança secular maciça na cultura nos últimos 20 anos. Ao longo da história, há muitos exemplos de quando os valores e a ética da sociedade impulsionaram novos comportamentos de compra do consumidor. Por exemplo, no passado, muitas marcas de moda/consumo se adaptaram depois de serem criticadas por fabricação antiética em mercados em desenvolvimento. Essas marcas perderam receita, reputação, fornecedores e funcionários que não estavam dispostos a trabalhar em uma empresa irresponsável.
Ajudamos as empresas que acreditam no valor em ter uma forte agenda climática a adquirir créditos de carbono da mais alta qualidade no mercado. Fazemos isso por meio de um modelo verticalmente integrado, desde o nosso fundo de terras, que adquire terras em risco na Amazônia, até a nossa equipe de especialistas, que implementa e comercializa florestas altamente biodiversas que removem muito carbono.
3. Quais são os números ou insights de mercado que mais te animam no espaço de SBN?
Atualmente, existem 60 mercados de carbono regulamentados no mundo. Por que carbono? A mudança climática é causada por uma única coisa, o carbono na atmosfera, e é por isso que os mercados de carbono são tão importantes.
Devido ao sistema europeu “cap and trade”, as empresas são obrigadas a reduzir suas emissões todos os anos e a compensar o que não puderem reduzir. Se você é uma empresa europeia produtora de energia ou fabricante, não tem escolha, precisa comprar créditos de carbono todos os anos. Esse é um mercado de US$800 bilhões.
A SEC, nos EUA, está começando a exigir que as empresas declarem seu carbon footprint em seus registros financeiros. O que acontece depois do registro está exigindo novas regras. Quando a SEC entender o que todo mundo omite, então virá a decisão. Portanto, a regulamentação está chegando e a cultura se importa.
Se você é uma plataforma global de tecnologia e todos os seus engenheiros mais valiosos descobrem que você está fazendo greenwashing. O que eles fazem? Vão embora. As pessoas tendem a fazer esse tipo de manobra, dizendo que o clima é apenas uma questão de relações públicas. Bem, não é, é uma questão de funcionários. É uma questão de recrutamento. É uma questão de retenção. É uma questão de receita. É uma questão de custos. É tudo, e está se tornando mais sério a cada dia.
4. Quais são as principais dificuldades ou travas que, se resolvidas, podem e têm contribuído para o crescimento das SBN?
Atualmente, há muito sofrimento humano relacionado ao clima - desde enchentes históricas no Paquistão, incêndios florestais na Califórnia, ciclones no sul do Brasil. Olhando para o futuro da mitigação de riscos, não há como mantê-lo em 1,5 °C ou menos sem obter 10 bilhões de toneladas de remoção de CO2 por ano. Hoje, estamos fazendo aproximadamente 5 milhões, portanto, isso precisa crescer 2000 vezes. Atualmente, a demanda já é de magnitude maior do que a oferta.
Esse desafio é acompanhado pelo fato de que, historicamente, o reflorestamento não era feito explicitamente para a remoção de carbono. Na maioria das vezes, era feito para que as árvores voltassem a existir por seu próprio valor intrínseco, fornecido por operações de pequena escala que não tinham a eficiência de uma empresa. Uma parte muito pequena do mercado estava sendo adaptada para criar um valor significativo a partir do mercado de carbono.
5. O que você gostaria de compartilhar com a comunidade NatureHub Brasil?
Acho que é claro que não há empreendedorismo suficiente no setor do clima, em geral, mas também no Brasil. Existem empreendedores talentosos e existem desenvolvimentos interessantes, mas acho que todos nós podemos dizer que deveria haver dez vezes mais. O Brasil tem, de longe, a maior oportunidade de mercado para reflorestamento, pois possui a maior floresta do mundo, a Amazônia, e ela corre um risco substancial.
Gostaria de encorajar os empreendedores que estão pensando no clima e na natureza a iniciarem o próximo capítulo criando soluções inovadoras no ecossistema de remoção de carbono mais importante do mundo.
Comments