"O dado que não me entusiasma mas que me motiva a fazer o que estamos fazendo vem do último censo agropecuário do IBGE. Lá diz que apenas 20% dos produtores recebem algum tipo de assistência técnica, pública ou privada."
1. Qual é a sua formação e experiência em SBN (soluções baseadas na natureza)?
Sou formado em design gráfico pela universidade de Brasília, trabalhei inicialmente com branding, depois fui pra São Paulo trabalhar com design de serviços e por último morei pela América Latina fazendo transformação digital pela McKinsey&Co.
Eu sempre tive noção do poder que um bom projeto de design tem, isso ficou mais claro ainda durante a minha carreira, eu sabia que um dia eu iria largar tudo e me dedicar 100% à um problema específico que eu escolhi.
Mas antes de chegar aqui fiz de tudo, desde levar um alto executivo para fazer etnografia na 25 de março, organizar um bem sucedido processo de transformação digital de um banco no Panamá e até desenhar processos da operação de uma mina de cobre no interior do Peru.
A área que eu já sabia que iria me dedicar é a agricultura, 95% do que a gente come vem da fina e frágil camada superficial do solo, sem essa camada não estaríamos aqui hoje. Ainda existiria civilização sem bancos, sem celular, sem satélites, mas não existe civilização sem comida.
Finalmente em 2021 consegui “largar tudo” e olhar para os desafios da agricultura com calma, primeiro me aproximando do Grupo Associado de Agricultura Sustentável, o GAAS, à convite do Eduardo Martins, que hoje é presidente do grupo. Lá eu conheci o Pablo Hardoim e o Rodrigo Barroso e nos tornamos sócios, eles que me guiam nessa jornada e são quem realmente entendem esse universo, eu sou apenas um designer.
2. Como você descreveria a proposta de valor da sua organização para alguém novo no setor?
A Trópica é uma empresa de educação que sistematiza as principais técnicas de agricultura regenerativa que estão sendo usadas hoje e oferece esse conhecimento em formato de cursos on-line, em linguagem simples e acessíveis à maioria dos produtores.
E porque estamos fazendo isso? Simplesmente porque ninguém mais está fazendo. Hoje se você quiser aprender como usar alguma destas técnicas você não vai achar no YouTube e muito menos na universidade, os produtores que aprenderam geralmente aprenderam com algum consultor que atendeu eles, ou então conversaram com outros que já estão fazendo. A gente facilita esse processo.
Mas não basta apenas colocar um instrutor na frente da câmera e gravar, o diferencial da Trópica é nossa equipe multidisciplinar. O Pablo e o Rodrigo são nosso corpo técnico, mas temos também a Michelly, que é responsável pela comunicação, ela traduz todo o tecniquês, edita o roteiro e se certifica que qualquer pessoa possa entender o curso, e depois tem eu que faço lindas visualizações, usando imagens, desenhos e esquemas para contar a história.
Nós lançamos o primeiro curso esse ano, é sobre multiplicação de bactérias na fazenda, já fizemos 8 turmas, com feedbacks muito positivos e 100% de recomendação. O dado que mais me orgulha é que 85% das pessoas que responderam que nunca tinham feito multiplicação de bactérias ou que sabiam pouco sobre o tema, saíram do curso se sentindo 100% seguras ou bastante seguras para começar a fazer. É um número muito bom tendo em vista que o processo envolve técnicas laboratoriais.
O próximo curso será sobre pó de rocha, ou mais tecnicamente: remineralizadores. Será com o maior especialista no assunto, vamos lançar agora no fim do ano.
3. Quais são os números ou insights de mercado que mais entusiasmam você no espaço de SBN?
O dado que não me entusiasma mas que me motiva a fazer o que estamos fazendo vem do último censo agropecuário do IBGE. Lá diz que apenas 20% dos produtores recebem algum tipo de assistência técnica, pública ou privada. Ou seja, 80% dos nossos produtores estão à Deus dará, sem nenhum apoio técnico formal, como queremos transformar a agricultura assim? Não tem como, tem que passar pelos produtores, no final do dia são eles quem vão ter que executar toda essa visão que vemos em congressos ou metas que são prometidas por CEOs e políticos.
Outro dado, que este sim me entusiasma bastante, é que usar estas práticas de agricultura regenerativa como multiplicação de microorganismos na fazenda, compostagem, plantas de cobertura e pó de rocha na verdade reduzem o custo de produção, tem produtor que consegue zerar o uso de químicos, mas uma grande parte reduz em uns 80% o uso de químicos.
4. Quais são as principais dificuldades ou gargalos que, se resolvidos, podem e têm contribuído para o crescimento das SBN?
Pra mim a maior barreira é a educação, mesmo que todos os líderes mundiais se reunissem hoje e decidissem que a partir de amanhã toda a agricultura no mundo vai ser regenerativa e que temos dinheiro infinito pra isso, ainda assim precisaríamos treinar centenas de milhões de técnicos e centenas de milhões de produtores em como fazer essa transição da melhor maneira possível.
5. Você pode ajudar a esclarecer ou contextualizar uma palavra/conceito no espaço SBN que você acha que é frequentemente mal compreendido?
Adotar práticas regenerativas não necessariamente significa aumentar os custos e perder produtividade, também não é algo que só funciona em pequena escala. Existe caso de produtor que depois que começou as práticas, aumentou a produtividade e reduziu significativamente o custo, isso em 10.000 hectares de soja.
6. O que você gostaria de compartilhar com a comunidade NatureHub Brasil?
Fico feliz de ver que tem tanta iniciativa em tantas frentes diferentes, contem com a Trópica para a parte de educação e treinamento.
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